A azeitona nossa de cada dia



A azeitona nossa de cada dia


Os aperitivos dos botecos paulistas são muito populares e salame, provolone e azeitona é de lei em qualquer roda. 

Aqui em casa bateu uma nostalgia de ficar com vontade de um boteco e, como não tá podendo, eu mandei ver na composição do aperitivo que fazia um sucesso muito grande com a minha turma do Anglo.


Esse grupo era fissurado numa manguaça que não tinha tamanho, principalmente nas noites de sexta. A gente dizia que "noite de sexta era pra profissionais". Se era ou não não sei dizer, mas tem história que não acaba mais. Essa turma era amarrada numa professora de Álgebra (sic). Ela era chegada - e todos nós também -  numa alquimia que a turma carinhosamente tratava por Quarteto Horror: Dry Martini, salame, provolone e azeitona!








- Muito prazer: Eu sou a CeHlma, assim mesmo com agá maiúsculo!

Foi assim que eu conheci a Profa. Dra. Rita CeHlma na sua primeira aula sobre Álgebra Booleana no cursinho do Anglo!




A moça era espevitada, falava pelos cotovelos.

A aula não tinha ponto, nem vírgula, só travessão. Nem sempre conseguia ir até o final das frases, principalmente depois de fumar "o enésimo", como dizia ela. Da Cátedra, polemizava quando não concordava plenamente com a linha filosófica do autor de algum teorema.


- É FALSO. No infinito as paralelas se encontram sim. Quando se encontram não são mais paralelas, pô! Esse lance de interseção geométrica tá furado. Tales não conhecia Einstein.


Doutora e Mestra de Álgebra Booleana, no cursinho ela arrebentava a boca do balão. Não tinha hora nem panos quentes - amolou, danou-se: lá vem bronca.


Mas não gostava de ser chamada de "professora".

- Títulos criam uma distância vetorial centro-convexa que não convém para nossas auras! Quero ser chamada de CeHlma, simplesmente. Quero que todos me considerem como uma colega de classe.


Aí de quem a chamasse pelo nome de Rita - horror.

- Não gosto desse nome RITA porque o meu avô era fã dos Mutantes, aqueles burgueses. Mas eu adoro a Rita Lee, uma querida.


(Ninguém discutia - afinal, incongruência ... é feminino, certo?)








A todos os homens tratava por "rapaz", apesar de saber de cor o nome de cada um de nós, e isso ficava evidente no bar do Chico.


Por princípio não escrevia na lousa - que sempre tratou por quadro negro: Elegia na sala um escriba para essa operação.

Eu fui escalado muitas vezes.

- Rapaz, você aí que é canhoto e fala pouco: Vem para o quadro negro que eu vou ditar a solução dessa equação.


Quando escolhia uma mulher, havia toda uma cerimonia para convidar a escolhida para a tarefa.

- Dona Cláudia Ivone Pereira Castanho de Abreu e Cunha: Gostaria de convidá-la para me auxiliar na árdua tarefa de redigir no quadro negro algumas expressões algébricas que elucidarão a solução do problema ora exposto à classe. A senhora aceita o convite?


Na classe só se ouvia o salto alto do caminhar da Claudinha, nem o ar se movia direito.


No boteco do Chico, defendia com unhas e dentes a mistura clássica inglesa à qual ela simplesmente comandava:

- Chico, o de sempre!


Apesar do Chico nos servir há muitos anos e conhecer a receita, não tinha escapatória:

Chico, faz com o copo gelado, 1 parte de vermute seco, 2 partes de gim, 1 twist de limão e azeitona verde. Sem caroço e sem palito, lembra?




Nunca me atrevi a querer saber a razão dessa composição. Sábia providência.


Certa vez, estávamos no boteco do Chico, todos e ela. As moças tomavam meia-de-seda e os rapazes conhaque com um twist de limão, que era bem mais barato do que um Dry Martini.







Mas, como tem o dia da caça e o dia do caçador, o "meu dia" chegou e eu arrisquei.

- CeHlma, sempre pintou em mim ... uma curiosidade, sabe?  ... é que eu pensei que ... será que não tem ..

- Rapaz, sem rodeios! seja preciso e conclusivo: o tempo urge - Carpe Diem, Carpe Diem!


Atordoei: Perdi a respiração, empalideci. A mesa toda se entreolhou com aquela cara de censura prévia.


- Tá: Afinal, qual o por que das tangentes se encontrarem no infinito?


- O quê?


Tremi


- Repita, repita, repita!


- É que a gente ... lá no infinito, ... nunca ninguém foi, né? É só essa a minha dúvida.


Levantou-se, tirou os óculos, e sentenciou:

- Rapaz, não tenha mais dúvidas, meu nome é CeHlma com agá maiúsculo. CeHlma com agá maiúsculo. Entendeu ou quer que desenhe?


- Chico, faz outro de sempre! Que porre essa rapaz!


Parei de respirar por inumeráveis segundos, escureceu, eu só tremia. Depois passou.


Nesse dia eu entendi que, fundamentalmente  ...

Bem, talvez você também já tenha entendido, né?

Eu bem que podia ter ficado quieto.


Mas, pra não perder a pose, também levantei e comandei como um lorde inglês:

- Chico, dá um conhaque liso pra mim e faz mais um "o de sempre" pra CeHlma!


- PARA TUDO! Quem mandou?  QUEM FOI QUE MANDOU?


A mesa entrou em estado de catarse. As moças coraram, os rapazes disfarçaram como que não tivessem ouvido nada.


- Nada disso Chico! Faz um "o de sempre" pra mim e outro igual também pro Marcio mas, no dele, não põe azeitona, que ele não aprecia.


- É mesmo, obrigado CeHlma. Você sempre pensa em tudo mesmo.

- Senta aí, canhoteiro, que eu vou contar uma boiada que rolou em Estocolmo!


Sentei sem sentir as pernas. Pensei em perguntar em que ano havia rolado a boiada em Estocolmo, mas meu anjo da guarda sussurrou:

"Mané, fica quieto: Faltavam menos de 10 horas pro sol voltar."


Uma coisa é certa: O nome dela eu nunca mais vou eu esqueci: Rita CeHlma.


CARPE DIEM !


Chega de Prosa


Aperitivo de Salame, Provolone e Azeitona


Ingredientes


250 g de salame italiano fatiado fino

250 g de azeitonas verdes

250 g de provolone picado em cubos

limão fatiado em quatro à gosto


Preparação

Disponha as fatias de salame num canto da travessa

Disponha as azeitonas no outro canto

esparrame o provolone cortado em cubos no meio

tempere a gosto

tenha palitos ou garfinhos para servir

siva o limão fatiado num pratinho separado


DRINKS


Meia de Seda


Ingredientes

1 Gim

1 Creme de Cacau

1 Leite condensado


Preparação

coloque todos os ingredientes numa coqueteleira

coloque cubos de gelo a gosto

Sirva com pitadas de  canela em pó 


Dry Martini


Ingredientes


45 ml Gim

10 ml Vermute seco

1 Casca em espiral limão

Cubos de gelo


Preparação


Encher um copo misturador com cubos de gelo. 

Adicionar todos os ingredientes. 

Mexer e coar em uma taça de coquetel. 

Decorar com casca de limão.


Dirthy Martini


Ingredientes


45 ml Gim

10 ml Vermute seco

5 ml Suco de limão

1 Azeitona verde

Cubos de gelo


Drithy Martini (Martini Sujo) é semelhante ao famoso Dry Martini. 

O buquê característico está no toque da salmoura da azeitona verde como guarnição do drink.

Há que faça com duas azeitonas espetadas.

O nome de "sujo" é porque a coloração do suco do limão tinge o gim, tirando-lhe a cristalinidade característica.

Esse é o "MARTINI" presente em todos os filmes de Bound, James Bound - agente 007.


Dica di Cuoco:

Para qualquer um dos "MARTINI", a prudência recomenda ingerir doses homeopáticas e intercaladas por algum alimento salgado e algum refrigerante doce.


Lembre-se: A noite é uma criança que, às vezes dorme cedo.



Marcio Martini

#ProsaGostosa #viamariabistro

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